ÍNTEGRA
do depoimento de ISA MUSA DE NORONHA
(Retirado
das Notas Taquigráficas da Câmara)
CPI
dos Fundos de Pensão.
Sras.
e Srs. Deputados, colegas aposentados e pensionistas assistidos da PREVI, da
FUNCEF, do POSTALIS que aqui estão e vieram acompanhar a CPI.
A
convocação para comparecer a esta CPI enche de expectativa e esperanças todo
o segmento de aposentados e pensionistas.
Nós
somos os mariscos dos embates entre patrocinadores e fundos de pensão.
Nós
sofremos os efeitos de uma legislação que muitas vezes rompe direitos
adquiridos, rompe o ato jurídico perfeito.
Sofremos
também pelas falhas de fiscalização, porque tanto na antiga SPC como agora na
PREVIC, temos observado que os processos de fiscalização são insuficientes sob
o ponto de vista dos interesses de aposentados e pensionistas.
O que
seria a falha no ato jurídico perfeito e a quebra de direitos adquiridos?
Eu me
refiro ao contrato de adesão que firmamos quando tomamos posse na estatal, no
caso, no Banco do Brasil e, compulsoriamente, somos chamados a aderir à
PREVI.
Pelo
menos era assim no passado, essa mudança passou a ser voluntária para os
planos pós-97.
E a
PREVI nasceu muito antes de qualquer legislação da Previdência.
Ela é
de 67, na forma como nós a conhecemos, e a primeira legislação é a 6.435.
Esses
contratos de adesão seguiam os moldes dos demais contratos.
Ocorre
que um fundo de pensão é um contrato de longuíssima vigência: 40, 50, 60
anos.
De
tal sorte, consideramos que tais contratos jamais poderiam ser alterados por
uma das partes, sem a concordância expressa, escrita, da outra parte - no caso,
nós.
E,
mais ainda: esse contrato tem três atores: o patrocinador, o fundo de pensão
e nós.
O que
ocorre é que patrocinador e fundo de pensão se entendem e alteram as regras
pactuadas no passado e nós sofremos os efeitos.
Nós
somos chamados a decidir, a votar em plebiscitos, uma coisa já pronta, já
formatada por patrocinador e pelo fundo de pensão.
Desde
a primeira edição de lei sobre a previdência complementar, nós, os mariscos,
assistimos à alteração dessas regras, o que é inadmissível.
Uma
lei, um decreto, não poderia vir para prejudicar.
Esses
só poderiam ter seus efeitos a partir da sua assinatura e atingir só quem
aderisse ao plano daí para frente.
Mas
não tem sido assim.
Eu
sei que o escopo desta CPI se restringe a investigações do período entre 2003
e 2015, mas para que possamos compreender o peso da ingerência política sobre
os fundos de pensão é preciso retroceder.
Todos
se lembram dos processos de privatização das teles, da Vale e da ingerência
política que ocorreu nessas privatizações do passado.
A
mesma Vale do Rio Doce, que primeiro tirou o Rio Doce do nome e agora o
riscou do mapa, teve ingerência política de entidades, pessoas do Governo,
para forçar a PREVI a participar do processo.
Todos
se lembram de um ex-diretor do Banco do Brasil, Dr. Ricardo Sérgio, aquele
que teria dito que agia no limite da irresponsabilidade.
Então,
a PREVI não está isenta, e nenhum outro fundo de pensão está isento, de
ingerência política.
Por
quê?
Para
nós aposentados e pensionistas, o que assistimos é que pagar benefício é um
mero detalhe de um fundo de pensão.
Objetivo
mesmo é servir de investidor institucional para as parcerias privadas, para
as obras da Belo Monte, para as obras do trem-bala, para as obras de
interesse de Governo, seja qual for o Governo.
As políticas
para fundo de pensão não são privativas de um partido, são políticas de
Estado.
Qualquer
que seja o Governo, nós vamos sentir o peso de sua influência sobre os nossos
interesses no fundo de pensão.
Bem,
quando a PREVI nasceu, em 67, havia um pessoal que já estava no Banco do
Brasil, que já estava aposentado.
Então,
o Banco do Brasil tinha compromissos com esse pessoal pré-67 e passava a ter
o compromisso de contribuir com os ativos e os aposentados a partir de 67.
Acontece
que essa poupança deveria ser formada ao longo de 30 anos.
A
PREVI só seria responsável por pagar os benefícios, por conta dela, PREVI, a
partir de 97; e durante todo esse período, o banco não fez aportes à PREVI.
Isso
foi objeto de investigação do Ministério da Previdência, e uma resposta de um
Presidente do banco, à época, confirmou que, de fato, o banco não estava
fazendo os aportes. Assim, em 97, acontece o começo do nosso calvário.
O
jornalista Aloysio Biondi revela em seu livro O Brasil Privatizado, que, por
interesses de governo, o Banco do Brasil apresentava um prejuízo monstruoso
em 96 e que necessitaria de aportes do Governo.
Na
época, Aloysio Biondi disse que esses balanços foram maquiados, porque
considerou como dívidas, como inadimplência, até dívidas que ainda não estavam
por vencer.
Pois
bem, em vez de recorrer ao PROER, o Banco do Brasil recorreu à PREVI.
Fez
um contrato entre o banco e a PREVI -, em que 5 bilhões da dívida do Banco do
Brasil para com a PREVI foram perdoados e os outros 4 bilhões e tanto seriam
pagos em 32 anos.
Então,
o começo do uso dos recursos de fundo de pensão pelos patrocinadores, no caso
do Banco do Brasil, começou em 1997.
Mais
tarde, no ano de 2001, o Banco do Brasil voltou a apresentar dificuldades
financeiras.
À
época, o jornal Valor Econômico, de 15 de fevereiro de 2001, estampou a
seguinte manchete: O Tesouro não terá que gastar nada para reequilibrar o
banco: existe um plano pronto para capitalizar o BB.
Qual
é a solução do Governo?
Utilizar
dois terços do superávit da PREVI, que o banco naquela época, em 2001, já
julgava pertencer a ele.
Os
diretores da PREVI, resistiram a essa investida e o Governo da época decretou
intervenção na PREVI.
Esse
interventor implantou a paridade contributiva, mandou apurar o balanço da
PREVI em 15 de dezembro, fora da época, e, do valor existente no
superávit, o Banco do Brasil se apropriou de 5,726 bilhões.
Mais
tarde, o Tribunal de Contas da União, em um processo de investigação que a
então-Senadora Heloísa Helena pediu, considerou estranho que a PREVI tivesse
feito esses acordos em condições tão favoráveis ao Banco do Brasil e tão
desfavoráveis à própria PREVI.
Ingerências políticas.
Na
época do interventor, ainda no Governo Fernando Henrique, o interventor da
PREVI, Carlos Eduardo Esteves Lima, nós aposentados, pensionistas, parte do
movimento sindical, todos nós reagimos à essa intervenção.
Achávamos
que era indevida a ingerência do Governo no nosso fundo de pensão.
O que
observamos?
Mais
tarde, esse mesmo interventor veio substituir a Ministra-Chefe da Casa Civil,
Erenice Guerra, já no Governo Lula.
Para
nós, fica bem evidente que não importa quem esteja no Governo, as coisas que
aconteceram no passado se repetem agora, mesmo sendo outro Governo.
Falhas
de fiscalização.
No
episódio do contrato de 1997, as associações de aposentados fizeram muitas
denúncias à antiga Secretaria de Previdência Complementar. Lamentavelmente,
aquele órgão, ao examinar tanto o estatuto quanto o contrato daqueles 11
bilhões, manifestou-se, através da Portaria 390, de 23 de dezembro de 97,
dizendo estranhamente que a análise da SPC considerou apenas a forma e não o
conteúdo.
Nós
achamos inadmissível que um órgão de fiscalização ao examinar um negócio de
11 bilhões não se manifeste com clareza a respeito da regularidade daquilo.
Mais
tarde, em 2006, a PREVI completava o terceiro o ano consecutivo de superávit.
Conforme
a legislação previa, seria preciso rever o plano de benefício.
A
PREVI, então, resolveu criar um benefício especial de renda certa que incluía
a inédita devolução de benefícios a alguns aposentados e pensionistas.
Nessa
devolução, a PREVI chegou a premiar 73 aposentados e pensionistas com valores
que variaram em 300 mil a 1 milhão e 75 mil.
Nós,
associação de aposentados e pensionistas, consideramos que
essa distribuição era ilegal, que feria a isonomia e que feria os direitos da
grande maioria dos participantes, e recorremos à PREVIC, recorremos à
Secretaria de Previdência Completar com denúncias.
Pois
bem... O uso da PREVI, dos fundos de pensão para outros interesses, senão o
de pagar benefícios não para por aqui.
Em 29
de setembro de 2008, o Conselho Nacional de Previdência Complementar criou a
Resolução CGPC 26.
Essa
resolução tem o objetivo de regular a Lei Complementar nº 109, no que se refere
a equacionamento de déficit ou de superávit.
A
CGPC 26 criou um monstro.
Ela
criou uma figura do patrocinador beneficiário de fundo de pensão.
Definir
por resolução que um patrocinador tenha direito a superávit é comparar um
fundo de pensão a uma empresa que tem lucro, que tem ações em mercado.
Um
fundo de pensão nasceu para pagar benefício.
Se
existe déficit ou se existe superávit, é uma questão de desequilíbrio que tem
que se ajustar revendo o plano, não é devolvendo nem para aposentado e
pensionista e nem para patrocinador.
Se
está sobrando dinheiro, é porque está pagando benefício de menos ou cobrando
contribuição a mais.
Se
está em déficit, é preciso analisar se o déficit é conjuntural ou estrutural
e rever as condições do plano também. Uma boa medida: agora o Conselho
Nacional de Previdência Complementar reviu essa equalização de déficit,
alongando o prazo para poder definir que um plano está realmente em déficit.
Foi
uma boa medida.
Deveria
fazer o mesmo com o superávit, porque, em 2010, ao criar um benefício
especial para a PREVI, acreditava-se que esse superávit era firme, forte e
seguro.
Ele
teve que ser suspenso antes do tempo previsto, porque o mercado entrou em
crise.
Então,
um fundo de pensão que vive das oscilações do mercado, sujeito a chuvas e
trovoadas, não pode considerar um prazo tão pequeno de 3 anos.
Esta
Casa poderia também estudar o alongamento, e até eu sugiro sustar artigos da
CGPC 26, que permitem que patrocinador fique com parte do superávit.
O
patrocinador não é aposentado e nem pensionista.
Existe
também no Senado um PDS, de autoria do Senador Paulo Bauer, que pede
revogação de alguns artigos da Resolução CGPC 26.
Outra
maneira de interferir no fundo de pensão através de atos do
patrocinador.
Em
2008, o Banco do Brasil alterou toda forma de relação trabalhista entre ele e
seus diretores. Ele transformou todos os seus diretores em diretores
estatutários e assim reuniu, nos vencimentos de cada diretor, todas as verbas
salariais.
Essas
pessoas passaram a se aposentar pela PREVI sem nenhuma observância de teto e
contando com verbas que não fazem parte do cálculo da grande maioria do
funcionalismo do Banco do Brasil.
O
Banco do Brasil, através desta medida, e a PREVI não estabelecendo um teto de
aposentadoria, de benefícios, está fazendo uma casta de super aposentadorias
colocando em risco todo o plano.
Nós
denunciamos o fato, mostramos que existem regras estatutárias na PREVI que
mostram quais são os valores que devem ser considerados para se conceder o
benefício inicial.
De
nada adiantou; a PREVIC não tomou nenhuma providência.
Aliás,
tomou: determinou que Banco do Brasil e PREVI implantassem o teto, fez uma
beleza de despacho, com todas as orientações sobre como a PREVI deveria
proceder, retrocedendo a 2008, revendo as aposentadorias que foram
concedidas acima do teto.
E a
PREVI simplesmente não cumpriu, o banco simplesmente não cumpriu, e a PREVIC
não fez nada.
Nós
temos recorrido, temos feito novas representações, cobrando providências da
PREVIC para que implante o teto.
Finalmente,
mais uma fórmula de desviar recursos de aposentado e pensionista e dos fundos
de pensão é a criação de bônus dentro da PREVI.
Ora,
o Banco do Brasil, quando dá lucro, ele paga bônus aos seus
dirigentes, aos seus diretores, isso porque a Assembleia Geral de
Acionistas se reúne e decide que parte do lucro será destinada a pagar
dividendos acionistas e parte do lucro será destinada a pagar bônus pelo bom
trabalho de diretores.
Pois
na PREVI adotaram o bônus, senhores.
A
PREVI, por similaridade com o Banco do Brasil, chega à conclusão de que os
seus diretores também têm direito de receber bônus, têm direito de receber o
que eles chamam de remuneração variável, PLR, participação em lucros.
Como?
Se
PREVI e todo fundo de pensão não dá lucro?
Fundo
de pensão tem, no máximo, superávit.
Como
podemos admitir, nós aposentados e pensionistas que somos os mariscos, que os
recursos do fundo de pensão sejam destinados para pagar privilégios, benesses
para diretores de fundo de pensão.
Então,
todas essas informações que eu trago aqui estão bem detalhadas com os anexos.
Eu deixo esta pasta com esta CPI. É preciso que os Srs. Deputados compreendam
que o que nós sabemos, nós aposentados e pensionistas, vem do que a gente lê
na grande imprensa e do pouco que escapa dos fundos de pensão, porque os
fundos de pensão, geralmente, são caixas-pretas.
E nós
não sabemos de nada do que acontece lá dentro.
Eles
têm um código de ética que impede que um conselheiro venha dizer para os seus
representados:
Olhem,
nós votamos isso ou aquilo lá no deliberativo.
Nós
não ficamos sabendo.
Sabemos
apenas dos efeitos, quando interferem diretamente na nossa vida, quando
colocam em risco a nossa velhice.
Eu
estou à disposição dos senhores e agradeço a oportunidade.
Espero
que os companheiros tenham ficado contemplados com a minha fala.
ISA
MUSA DE NORONHA
(isamusa@uol.com.br)
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