sexta-feira, 1 de julho de 2016

INTOLERÂNCIA

Aceitar e tolerar, e por que não dizer, até apreciar que nossos semelhantes pensem de forma diferente do que a nossa, é uma das virtudes mais admiráveis em qualquer ser humano.  Sobre isto, nada melhor do que repetir a máxima de Voltaire:
“Discordo daquilo que dizes, mas defenderei até a morte o teu direito de o dizeres”.
Embora Voltaire tenha usado, com certo exagero, a expressão pleonástica “até a morte”, aceitar a diversidade de opiniões, é uma qualidade em qualquer sociedade.
Essa é a razão por que apreciamos as sociedades democráticas, onde você tem a liberdade de expressar suas opiniões, sem temer e ser molestado por um estado ditatorial e opressor.
Sobre esse aspecto, lembro Angela Davis, integrante do Partido Comunista Norte-Americano e membro do grupo Panteras Negras nos anos 70, que, quando foi perguntada por um jornalista, por que pertencia ao partido comunista no maior país capitalista do mundo, como os Estados Unidos, respondeu:
“Não conseguiria viver em um país onde não pudesse me expressar livremente. Por isso, gosto do Estados Unidos, embora seja contra o sistema capitalista. ”
Parei de assistir aos debates sobre o impeachment, no Canal 540, da Globo News.  São gritos, ofensas, xingamentos, desrespeito a quem está com a palavra, contestações descabidas e por aí vai.
Querem impor na marra e no grito seus pontos de vista a outros que divergem de sua forma de pensar.
Tem momentos em que o coordenador do debate é obrigado a suspender as sessões, pois corre-se o risco de os debatedores chegarem às vias de fato, tal o nível da exaltação de ânimos e descontrole pessoal.
E chamam isso de “debate democrático. ”
Contesto essa visão, pois não considero “democrático” tentar impedir que outra pessoa expresse suas ideias no tempo que lhe é cedido para sua manifestação.
Quando esses debates chegavam a esse ponto, desligava a TV ou mudava de canal.
Atualmente, prefiro ver o resultado das discussões, de forma tranquila, quando leio o jornal no café da manhã.
Mas muitas pessoas acham natural que, no calor dos debates, esses excessos possam ocorrer.
Só voltarei a assistir à votação final sobre o impeachment. Aí vai ser eletrizante.  Vai ser uma decisão histórica que vai definir o futuro de nosso país.
Vai ser uma emoção comparável a assistir a um final de Copa do Mundo.
Eu aceito, acho divertido e até salutar que, nos estádios de futebol, as pessoas deem vazão às suas repressões, às suas mágoas e às suas frustrações. Muito embora, as pessoas   que são mais xingadas, sejam as progenitoras do juiz, dos bandeirinhas e dos massagistas, que não tem nada a ver com a partida de futebol que se disputa no gramado. Eu mesmo caio na gargalhada quando os ofendidos massagistas, que vão socorrer os jogadores, são chamados de “parteiras”.  
Mas o que acho que as autoridades devem reprimir, é o que está acontecendo em relação a protestos raivosos visando desestabilizar as pessoas, perturbar suas vidas privadas e sua paz familiar, e chegar quase que ao ponto da agressão física.
Isso não tem nada a ver com democracia ou liberdade de expressão.
E aí não faço distinção de preferências políticas.
Todos esses manifestantes, seja qual for a causa ou linha política que defendam, cometem o mesmo abuso.
Como exemplos recentes, que podem ser acessados pelo Google ou pelo YouTube, cito as manifestações em frente da residência, em São Paulo, do Presidente em Exercício Michel Temer, que perturbou a paz de sua esposa Marcela e de seu filho Michel.
Outro caso recente, foram os apupos, gritos e insultos recebidos pela Senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), por parte de um grupo de manifestantes, quando desembarcava no Aeroporto Internacional de Curitiba. Embora não pactue com suas ideias, e a ache exaltada e até desrespeitosa com seus pares nos debates sobre o impeachment, reprovo completamente essa agressão da qual a senadora foi alvo. Foi um vexame a situação pela qual ela passou.
Em 29.06.2016, quando desembarcava no Aeroporto de Brasília, a Advogada Janaína Paschoal, que é defensora do processo de impeachment, sofreu o mesmo tipo de manifestação abusiva e insultuosa.
Esse tipo de ação não é admissível sob nenhuma hipótese.
É simplesmente agressão pessoal. Portanto, é caso de polícia.
Respeito à diversidade de opiniões e de escolhas é fundamental.
Até nos nossos relacionamentos pessoais devemos seguir esse princípio.
Existem pessoas que nos amam como somos, gostam da nossa forma de agir, respeitam nossas excentricidades, e preferem apreciar nossas virtudes em lugar de nos detestar e nos apoquentar pelos nossos defeitos.
O melhor a fazer numa situação como essa, não é agredir ninguém pela forma como pensam.  Simplesmente, devemos nos afastar das pessoas que não tem afinidade e não gostam da gente.   
Há muito, a revista Reader’Digest, publicava uma coluna chamada “Meu Tipo Inesquecível”. Pena que a revista tenha eliminado essa área. Era um dos pontos altos da revista e falava da admiração que nutrimos por determinadas pessoas que, de forma geral, são desprezadas e até detestadas por outras.
Quando tinha meus 17 anos, e estudava no Curso Satélite, na Rua Acre, no Rio, para entrar no BB, fui obrigado a morar em uma hospedaria de quinta categoria na Rua do Lavradio, pois estava sempre na pindaíba. Éramos seis em um quarto com 3 beliches.
Um horror. Saíam discussões, alguns choravam por problemas familiares e depressão, tinham os que soltavam pum, outros roncavam, alguns tinham chulé, e outros não tomavam banho.  Tinha um português, dono de um botequim, que andava de camiseta, tamancos, tinha bigode e era torcedor do Vasco. Monopolizava a única mesa do quarto com suas coisas e só dormia com a janela aberta, fosse que frio fosse.  Outro, era um rapaz de cor, gordo, e que só dormia de janela fechada. Então, a noite inteira, era um constante deita e levanta do português e do negão, a fecharem e abrirem a janela. Até que um dia os dois saíram no braço. Foi uma boa briga.
Mas o caso que mais chamou minha atenção, foi um cronista esportivo que era alcóolatra. Era quem classificava como o “Meu tipo Inesquecível”. Bebia uma garrafa inteira de cachaça de uma vez só e, às vezes, entrava pela segunda garrafa. Tinha só a metade do pulmão; havia perdido a outra metade pela bebida.
Depois ia dormir. Quando não dormia, ficava falando sozinho e não deixava ninguém dormir.
Mas, nas vezes em que estava sóbrio, era uma pessoa admirável. Nesses momentos, era um tipo espirituoso, culto e divertido, que escrevia suas excelentes crônicas esportivas à mão, as quais vendia a um jornal da época. Sobrevivia desse dinheiro. Foi abandonado pela família em razão da bebida.
Um belo dia, bebeu tanto e perturbou tanto, que o pessoal da hospedaria o amarrou em uma maca, e o colocou na rua.
Logo após, saí daquela espelunca e nunca mais o vi.
Nunca consegui esquecer esse personagem. Que vida atormentada!!
A propósito desse período um tanto conturbado de minha juventude, acrescento que, além do Curso Satélite, na Rua Acre, eu cursava, à tarde, o Colégio Amaro Cavalcante, no Largo do Machado.
Ía de um lugar a outro a pé, porque a grana era curta.
Para minha absoluta e agradável surpresa, há alguns dias atrás, fui lembrado pelo Waldir Argento, da AAFBB, que ele havia estudado comigo, no mesmo colégio. É espantoso que, depois de 57 anos, o Waldyr Argento tenha se lembrado de nossa convivência no Colégio Amaro Cavalcante!!
Conto esses fatos, para falar da diversidade humana e do respeito que temos que ter com nossos semelhantes.
Devemos ser tolerantes com as pessoas, mas temos de nos afastar daqueles que não nutrem simpatia por nós, e temos de nos apegar àqueles a quem amamos e que também nos amam.
Tem um ditado que diz: “Só ame quem lhe ama. ”
Parece lógico, parece fácil, parece simples, mas todos sabem, até pelas experiências da vida, que essa “lógica”, por vezes, é muito difícil, quando não impossível de ser atingida, e é a base de nossa felicidade.
Para finalizar, segue outro pensamento, de Manuelle Leite:
“Coração dos outros é terra que ninguém pisa. ”
Adaí  Rosembak
Associado da AAFBB, ANABB, AFABB-RS e ANAPLAB

2 comentários:

  1. Caro Adaí,


    Nesse caso a pergunta que se impõe é:

    Até quando, quanto e a que ponto deve o Tolerante tolerar a intolerância do Intolerante?

    Uma coisa é respeitar o direito das pessoas manifestarem o seu direito de defender livremente uma tese.

    Outra é ser usado por essas mesmas pessoas - em virtude da nossa tolerância e espírito democrático - para que elas consigam, mesmo que/quando minoritariamente, impor o seu pensamento à maioria.

    E essas cenas que o amigo está assistindo de intolerância e até de agressividade moral e física, nada mais são do que o resultado que se faz sentir do trabalho das minorias carentes de argumentos válidos, para solapar a paciência, a ética, o respeito e o espírito democrático daqueles que resolveram que pensar é melhor do que entregar seus preguiçosos cérebros ao comando de ideologias dogmáticas e deturpadores da realidade.

    E tudo isso insuflado por pseudo lideranças que são capazes de tudo e “fazem qualquer coisa” para não perder eleições. E o limite desse “qualquer” aparecem todas as manhãs nos noticiários, com novas siglas, mas com os mesmo e previsíveis atores.

    Para esses indivíduos, quanto mais rasteiro for o ambiente do debate e quanto mais desprovido de inteligência, melhor.

    Veja as soluções que eles trazem para os problemas sociais, sempre nivelando por baixo. Perseguir um projeto de excelência, nem pensar.

    Chirivino

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    1. Caro Chirivino,

      Concordo plenamente com tudo o que você diz.
      Só que eu me coloco na posição da maioria dos senadores que, no dia da votação do impeachment, vão votar a favor da saída de Dilma.
      Ou seja, para que vão ficar batendo boca com Gleise Hoffmann, o Lindberg Farias e outros fósseis de outras eras políticas ?
      O que importa mesmo é o voto.
      Por isso, deixei de assistir a esses debates chatos e irritantes.
      Não vou perder meu precioso tempo com esse tipo de coisa.
      Mas estarei com os ouvidos atentos e os olhos abertos no dia da votação do impeachment.
      Isso é o que importa.
      Sejamos objetivos.

      Abração

      Adaí Rosembak

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